FIM DA ESCALA 6X1: O DESPERTAR DA CLASSE TRABALHADORA POR QUALIDADE DE VIDA, LAZER E TEMPO DE QUALIDADE COM A FAMÍLIA
Precisamos falar sobre o fim da escala 6x1 e tudo que isso representa para a classe trabalhadora brasileira. Sim, precisamos falar, já ouvimos demais e esse não é o primeiro projeto apresentado neste sentido. Há muitos outros adormecidos nas gavetas de mogno das casas legislativas. Esquecidos, ignorados, silenciados pelos “nobres” deputados que ganham mais de R$40 mil por mês e comparecem duas, três vezes de semana aos seus postos de trabalho, fora verbas de gabinete pra contratar a peso de ouro assessores e assessoras.
Mas há algo de diferente na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) apesentada pela Deputada Érica Hilton (PSOL-SP) que vai além das incríveis 216 assinaturas e que explica a adesão de mais de 1/3 da Câmara dos Deputados (são necessárias 171 assinaturas para a tramitação de uma PEC). Existe um tempero especial que faz de uma proposta indigesta à classe política, um debate moralmente obrigatório e, ainda que engavetada, o que não desejamos, uma mostra de força da massa trabalhadora, que não suporta mais viver para trabalhar e trabalhar pra viver.
Mas afinal, o que faz desta uma proposta diferente? Vamos por partes e permita-me um regresso ao já longínquo ano de 2017, onde sob o famigerado Governo de Michel Temer e sem qualquer pudor, aprovou-se a toque de caixa uma reforma trabalhista, que de reforma nada teve, senão para retirar centenas de direitos trabalhistas, em nome de uma flexibilização a qual só o trabalhador pagou a conta. Desde então e já a caminho de 2025, portanto quase 08 (oito) anos depois, esse é o primeiro grande debate sobre um direito dos trabalhadores. É um marco importante de retomada de consciência de classe e luta coletiva por respeito e condições dignas de trabalho.
Seguindo a linha do tempo, não havia talvez um ponto tão sensível e uma luta tão histórica para marcar a retomada da luta coletiva quanto a jornada de trabalho. Não se trata apenas de discutir se a escala 6x1 é a mais viável. Como disse, já ouvimos demais e nossos meios de comunicação estão à serviço do capital, portanto, vão tentar te convencer de que isso é loucura, mas sabemos que não é. Sabemos que há categorias e categorias e que simplesmente discutir escala de folga sem considerar suas respectivas particularidades é fadar esta proposta ao fracasso, com o mesmo apelo popular que ela chegou à condição de tramitação. Eles vão gritar “desemprego”, “aumento de preços”, “crise”, “recessão”, “comunistas”. Eles só pensam no dinheiro, mesmo que isso custe sua saúde, sua sanidade, sua vida.
Para esta questão existem os sindicatos e as jornadas de cada categoria podem ser objeto de negociações coletivas, onde empresas e empregados podem chegar a um denominador comum, sem a necessidade de o mundo acabar. Ou não é verdade que pra além das extenuantes 44 (quarenta e quatro) horas semanais não somos frequentemente acionados a fazer horas extras, protegidas por banco de horas, a propósito, controlados pelas empresas. Que equilíbrio é esse que as empresas, com proteção legal, podem aumentar nossas jornadas, mas os trabalhadores não podem pleitear a redução, sob pena de desemprego?
É importante deixar claro, e isso a mídia não vai te contar, que a PEC proposta pela Dep. Érica Hilton (PSOL-SP), está ancorada em dois movimentos: um de empresas, outro de trabalhadores. O “4 days week” (4 dias por semana, na tradução), um experimento mundial que, visando a redução de horas trabalhadas e aumento da produtividade, com maior tempo de vida de qualidade dos trabalhadores, avalia que, em 04 (quatro) dias por semana, um trabalhador médio consegue ser mais produtivo, apresenta menor índice de adoecimento e entrega mais resultado, eliminando horas ociosas em seus postos de trabalho. Este experimento é realizado a anos em todo o mundo e os resultados surpreendem. Ou seja, é possível reduzir jornadas, sem reduzir produtividade e resultados, ao contrário. As pesquisas apontam ganhos.
Um segundo movimento, este de trabalhadores brasileiros, cansados com a sobrecarga das 44 (quarenta e quatro) horas semanais, trabalhando seis dias por semana, folgando apenas um e muitas vezes, convocados a trabalhar em folgas, deu origem ao “Vida Além do Trabalho” – VAT, movimento que por óbvio ganhou apelo das massas e nas redes sociais, promoveu debates riquíssimos sobre a necessidade de voltarmos a discutir redução de jornada de trabalho, discussão que vinha sendo escanteada desde que a CLT fixou jornada de 44 horas. Movimentos pela redução para 40 horas ficaram de lado e essa conta chegou.
E como chegou. Milhares de trabalhadoras e trabalhadores padecem doenças psicossomáticas, adoecimento e envelhecimento precoce, síndrome de burn-out , exposição a acidentes de trabalho, dentre outras tantas doenças ocupacionais que lotam consultórios médicos e filas do INSS e que estão umbilicalmente ligadas ás jornadas de trabalho, que privam o trabalhador do convívio social e familiar, reduzem suas possibilidades de prática esportiva e contato com a natureza, expõe à permanente estresse de trânsito, transporte público, etc. É nítido que a classe trabalhadora está cansada e precisa dispor de mais tempo para cuidar de si e dos seus, mas a média de 10, 11 horas à disposição do trabalho, considerando deslocamentos (número que chega a 15 horas nas capitais e regiões metropolitanas), furta os trabalhadores e trabalhadoras de qualquer chance de uma vida de qualidade.
Sem perspectiva de aposentadoria, com reformas previdenciárias que cada vez deixam mais distantes o sonho do descanso, a receita do capital vai mudando. “Coachs” e sabichões entram em campo e arrastam multidões a acordarem às 04h (quatro da manhã), a tomarem um café reforçado e vendem o sonho da riqueza, que sabemos, é uma utopia capitalista e só favorece o patronato, que apesar de ver todo o esforço, é em geral, incapaz de promover a qualificação da mão-de-obra, a participação nos lucros, o incentivo àqueles que se destacam. Abominam qualquer discussão neste sentido e trabalham para eleger deputados e senadores que bloqueiam essa pauta. Mas, se todo poder emana do povo, porque não lutar? Lutar pelo fim da escala 6x1, lutar pela redução de jornada de trabalho, lutar por qualidade de vida para quem move a economia e carrega nas costas o país, a classe trabalhadora.
Não é papo de maluco, nem de comunista. Não se trata de comparação sobre “como é lá nos EUA”. Pouco importa isso tudo se milhares de trabalhadores perderam a perspectiva de vida além do trabalho e estão mergulhados em vícios, em toneladas de antidepressivos que se toma diariamente no mundo inteiro. Um pra conseguir trabalhar, outro para conseguir dormir. Se trata da família que os espera ao fim do dia, aos fins de semana e contam que estarão com eles até o fim da vida.
Por tudo isso é preciso lutar pela redução das jornadas de trabalho, entrar na guerra contra aqueles que fazem desta uma discussão rasa, que usam da ameaça e do medo para desmobilizar trabalhadores, deixar de lado a paz covarde da vida medíocre e ter coragem de dizer: “Estamos cansados de jornadas extenuantes e precisamos de vida além do trabalho”. E este é um cenário perfeito para retomada da discussão de direitos trabalhistas. Para se pressionar a classe política, para se evolver na luta coletiva. Até duas semanas ninguém acreditava na PEC do Fim da Escala 6x1, hoje ela é realidade e com 216 assinaturas ela vai tramitar na câmara. É hora de sabermos se aqueles parlamentares que se dizem “pela família” são só pelas suas próprias famílias ou se eles valorizam a família brasileira.
Pelo fim da escala 6x1,
Pela redução das jornadas de trabalho,
Lutemos!
*Texto: Marcelo Braga
Juntos somos mais fortes.
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